Colaboradora Taline, dirija-se ao guichê do abraço.

Gosto de todas as tarefas da casa, exceto uma aqui na horta, outra ali no jardim. Descobri que além de análise, terapia de casal, aulas de Balance com Carol Brasil (aliás, por que você não está lá comigo? Clique aqui e fale com ela), cuidar do espaço que nos abriga é, também, uma possibilidade rotineira de cuidar das questões emocionais – já que enquanto estamos no fazer do lavar, limpar, secar, estender, aguar, guardar, forrar, pouca gente se interessa por nós. Corre cada um para um lado e ficamos ali, grudados em nossa própria existência, como nossos próprios pensamentos, em processos de elaboração que podem ser muito efetivos.

Nestes momentos, vez por outra, anoto perguntas aleatórias que me vêm.

– Por que há tantas capivaras em Brasília?
– O Acampamento Terra Livre tem mantenedores do setor privado?
– Como era o nome daquele vibrador masculino que Ana Canosa me mostrou?
– Seriam Rudolf Steiner uma espécie de tutor do menino Adolf Hitler?
– O que Bell Hooks diria diante desse cenário na educação brasileira?
– Carbonara ou pesto?

Mas lá fora, no fabuloso e hermético parque de diversões dos afazeres domésticos que acontecem no quintal artificialmente iluminado do consumismo, é que consigo meditar profundamente. Especialmente em supermercados, onde o meu cérebro adota um modo de economia de energia radical. Gasto, não penso; pago quando dever. Enquanto pego tomate pelado, meu pensamento anda nu. Na prateleira dos cotonetes, nem sei que música toca no ambiente. Sabão líquido, amaciante, água sanitária e cera para o piso enquanto flutuo sem carregar um grama.

No auge da minha meditação vespertina, dia desses, fui chamado e convidado a participar de um evento sem precedentes. Um abraço carinhoso, emocionado, generoso no corredor central de um supermercado enorme. O tempo do consumo e da meditação numa pausa inesperada que desafia a própria razão de existir do empreendimento. A jovem mulher olhava timidamente entre o fósforo e as velas e, quando virei a esquina da gôndola, abriu um sorriso a granel.

– Peu?

Sempre me coloco inteiramente à disposição destes momentos porque não acredito que sejam casuais, e sim costuras delicadas do Universo.

Taline falou do Dilemas, falou das minhas cartas aos meus filhos e às minhas filhas, falou da minha relação com Lua, falou que trabalhava naquele supermercado e nunca imaginou que iria nos ver por ali. Mas moramos aqui perto, mulher, adoro vir aqui. Não acredito. Verdade. Vem cá, vamos fazer uma selfie? Vamos.

Saí do transe meditativo pensando que bonito pode ser nosso caminho se, simplesmente, encontrarmos mecanismos honestos para (1) ser o que acreditamos, (2) fazer o que aprendemos, (3) falar o que pensamos e, de 1 a 3, preservar a possibilidade de se enredar na história do Outro e permitir que ela ou ela esteja enredado na nossa – não importa se estamos tão distantes quanto duas telas ou tão próximos a ponto de poder abraçar.

Pedro Barros Fonseca

pedro fonseca

pai de João, Irene, Teresa e Joaquim.

Anterior
Anterior

Que dia é hoje?

Próximo
Próximo

Não leio sinopses.